terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Óculos rosa da nostalgia

Se no passado fui boba, ( uma palavra bonita para o que realmente fomos) hoje sou niilista
Morreu em mim: toda duvida, todo sentido, os princípios absolutos se dissolveram ainda mais, tudo agora é posto em discussão antes de qualquer atitude. Morreu a esperança de dias melhores, de humanidade evoluída, morreu a reciproca compaixão na sociedade.
O que resta dos anos passados e da juventude é a nostalgia que hoje deixa tudo muito bonito e brilhoso, até parece que não nos magoamos, que não nos submetemos, que não suportamos dor alguma... Os sorrisos da época hoje me parecem reais, os planinhos mirabolantes hoje parecem molecagem, as opiniões defendidas hoje parecem piada.
Não escolhemos o que queremos da vida mas nos tornamos responsáveis por quem somos hoje. Enquanto você cresceu, largou a faculdade, foi levado pelos homens de farda para lutar pelos EUA e explodir bombas no Japão e voltou para matar um leão por dia e por comida na boca de seus filhos e sua esposa eu estava assistindo Casablanca, estava lendo Agatha Christie, estava conversando sobre Camus, Beauvoir e Sartre com a nova turma dos anos 40/50
O tempo é implacável... E mesmo assim existem coisas que simplesmente não superamos; não conseguimos, e vez ou outra, uma vez ao ano as vezes até mais, elas resurgem nós deixando com aquele sabor amargo na boca que aos poucos vai ficando rosa e doce, as lembraças vão ficando mornas e inocentes, aquecendo o coração e nos levando por um breve instante a um lugar muito feliz que nos pertence pois já foi nosso em algum momento do passado. 
É tão fácil para quem tem memória e tão difícil para quem tem coração, a vida segue e o mundo corrói nossa esperança, só nos resta estes momentos nostálgicos que nos proporcionam quem sabe a força essencial para continuar.


Um comentário:

  1. O niilismo é um moedor de presente e de futuro. Por algum motivo muito misterioso, porém, ele não consegue tocar o passado. A nostalgia que sobrevive, armadilha da relação entre consciência e memória, é prova mais do que cabal de que o significado das coisas não está morto; que ele existiu e, portanto, que ele é possível. Mas por algum motivo muito misterioso, a nostalgia não é suficiente para nos fazer reencontrar o sentido.
    Algumas coisas, eu acredito, não dependem de nós. O mundo nos influencia de formas que não podemos nem ao menos imaginar quais são. O seu poder sobre nós é na verdade muito maior do que o nosso por nós mesmos. E isso irrita. E quando esse domínio nos enverga até quase quebrar, o niilismo aparece como uma forma de neutralizar essa influência. Ele nos devolve o domínio sobre nós mesmos tirando do mundo o próprio sentido.
    Sem o sentido, no entanto, o que nos resta é muito pouco: é nostalgia. O niilismo é um bom refúgio, em alguns momentos talvez seja até necessário. Mas é inútil procurar nele a paz. A paz só vem através do sucesso, e o sucesso só se faz possível através do enfrentamento.
    parabéns pelo texto.

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